“NOSSOS SONHOS NÃO CABEM EM VOSSAS URNAS” Descrença/Negação da Representação-Plutocrática no Brasil – Votos Nulos, em Branco e Abstenções Ressignificados”

NOSSOS SONHOS NÃO CABEM EM VOSSAS URNAS”[1]

Descrença/Negação da Representação-Plutocrática no Brasil–Votos Nulos, em Branco e Abstenções Ressignificados”

Wallace de Moraes[2]

 

INTRODUÇÃO

As eleições majoritárias de 2014 e 2016 apresentaram algumas evidências importantes para teorizarmos. Em 2014, pela primeira vez na história recente das votações no estado do Rio de Janeiro, um governador – Luiz Fernando Pezão – foi eleito com menos votos que a soma das abstenções, votos em branco e nulos. Situação equivalente aconteceu com a candidatura de Dilma Rousseff no primeiro turno das eleições no estado. Em 2016, nas eleições municipais cariocas, a tendência foi ratificada, pois também de forma inédita o prefeito da cidade do Rio de Janeiro, Marcelo Crivela, foi eleito com menos votos que a soma de brancos, nulos e abstenções.

Quais interpretações podemos extrair desses dados? Estaríamos vivendo uma crise da democracia representativa, como apontaram Boaventura de Souza Santos (2003), Noam Chomsky (1999), C. B. Macpherson (2003), Castoriadis (2002) e David Graeber (2015)? Ou apenas uma crise da representação que não atinge o apoio à democracia enquanto regime, como asseveram Pippa Norris (1999), Russel J. Dalton (2000a), Dalton e Martin Wattenberg (2000b), Dieter-Fuchs (1999); Richard Rose, Doh C. Shin e Neil Munro (1999). Não obstante, todos concordam que os principais institutos do modelo representativo passam por profunda crise e é exatamente sobre isso que pretendemos discorrer com dados empíricos. Juntos estão preocupados com os altos índices de abstenção nas eleições, com o esvaziamento dos partidos políticos, das associações de todos os tipos, enfim, com o declínio do que Robert Putnam (1999) chamou de capital social, concomitante com a crescente descrença na legitimidade e eficácia das instituições políticas.

O objetivo deste paper consiste em buscar responder algumas indagações de interesse público: 1) o crescimento dos votos nulos, em branco e das abstenções constatados nas últimas eleições no Rio de Janeiro são episódicos? 2) esses votos em não candidatos possuem alguma analogia com a insatisfação popular em relação a governos, congressistas e partidos políticos? 3) se existe uma insatisfação popular, ela está circunscrita ao Rio de Janeiro ou extrapola seus limites? 4) existe alguma relação desses não votos com a conjuntura econômico-social, em particular com o desempenho do PIB e/ou com os índices de desemprego, ou com os protestos de 2013, ou com surgimento de novos movimentos sociais? 5) por fim, estas constatações ratificariam a crise do regime plutocrático-representativo no Brasil já vislumbrada por alguns teóricos em outras partes do mundo?

A literatura clássica da Ciência Política negligencia esse fenômeno, chamando-o depreciativamente como resultado exclusivo da apatia política (Schumpeter, 1942), ou como algo positivo significando o bom andamento do regime (Lipset, 1963; Huntington, 1975, Weyland, 2004). Os oligopólios de comunicação de massa no Brasil “descobriram” esses números apenas em 2016, pois até as eleições de 2014 os consideravam apenas como votos inválidos e teimavam em ignorá-los.

Não negamos que parte desses não votos (abstenção) e dos votos em não candidatos (opção branco e nulos) somados – chamaremos essa soma daqui por diante de “descrença/negação da representação-plutocrática” – são fruto de eleitores apáticos politicamente, todavia partimos da hipótese segundo a qual essas opções são em parte extremamente politizadas e caminham concomitante com a indignação dos governados com o desempenho dos partidos políticos, dos parlamentares, dos governos e do Estado. Em outras palavras, hipotetizamosque a descrença/negação da representação-plutocrática se materializa em um misto de descrédito nas principais instituições do modelo plutocrático-representativo (Ver DE MORAES, 2018), expressada em seu conjunto da seguinte maneira: 1) crise da representatividade político-eleitoral no mundo ocidental e em particular no Brasil, materializada por meio da descrença dos governados em suas principais instituições; 2) relação expressa com crise econômica, queda do PIB, aumento do percentual de desemprego e descontentamento com políticas adotadas pelos governantes políticos; 3) herança da Revolta dos Governados de 2013.

Com vistas a comprovar nossas hipóteses recorremos às seguintes fontes: 1) pesquisas de opinião pública elaboradas por dois institutos de ilibada reputação acadêmica: EurobarometerLatinobarómetro; 2) dados econômicos e sociais aferidos pelo IBGE; 3) resultados eleitorais a partir dos números disponíveis pelo TSE[3]e TRE/RJ[4]para a presidência da República, entre 1989 e 2014; para governador do Rio de Janeiro, entre 1982 e 2014; e para prefeito da cidade do Rio de Janeiro, entre 2004 e 2016; respectivamente.[5]Portanto, nossa metodologia de análise se embasará no estudo de surveyssobre confiança nas instituições políticas realizadas pelos supracitados institutos, nos resultados das eleições brasileiras e no cruzamento com os índices oficiais de desemprego e desempenho do PIB.

Destarte, mostraremos que desde as eleições de 1982, para governador do Rio de Janeiro; 1989, para presidência da República; e, 2004, para prefeitura da capital fluminense, há uma relação quase que direta entre crise econômica e de desemprego com a abstenção eleitoral, o voto em branco e o voto nulo expressado pelos governados.

Escolhemos o eleitorado do Rio de Janeiro para análise central em função de inquietações que surgiram em outra pesquisa, que desenvolvemos paralelamente sobre o a Revolta dos Governados de 2013/14 nesse estado. Os dados empíricos que balizam nossas teses e nos levaram a realizar essa pesquisa são os seguintes: 1) a revolta de 2013 no Brasil teve a maior intensidade com maior número de participantes e durabilidade justamente no Rio de Janeiro; 2) uma de suas principais expressões foi a negação dos partidos políticos e dos políticos em geral; 3) durante as eleições de 2014/2016, diversos coletivos políticos intensificaram campanha política pelo voto nulo, em branco ou simplesmente pela abstenção; 4) o governador do estado (2014) e o prefeito da capital do Rio de Janeiro (2016) foram eleitos com menos votos que a soma dos nulos, em branco e das abstenções, justamente após os protestos de 2013.

Outrossim, entendemos que os estudos sobre o fenômeno dos votos “inválidos” (forma como vem sendo tratada pejorativamente pelos governantes socioculturais) são marginalizados e enquadrados na perspectiva dos saberes sujeitados (Foucault, 2002) ou sofrem perfeitamente do epistemicídio acadêmico (Santos, 2003). Com vistas a superar essa discriminação epistemológica e preencher essa lacuna acadêmica que importantizamosdesenvolver a pesquisa que segue para tentar mensurar esse (não) voto de protesto, mas sobretudo jogar luz para os milhares de governados que estão sob o comando de políticos que não foram escolhidos pela sua maioria. Entendemos que se trata de um grave obstáculo democrático, não tratado adequadamente pela literatura.

paperestá disposto da seguinte maneira. Primeiro, essa introdução na qual apresentamos o tema, seu recorte temporal e espacial, nossas hipóteses, objetivos e metodologia. Em seguida, faremos uma breve discussão teórica sobre o assunto. Mais à frente, discutiremos, respectivamente, a partir dos dados do Eurobarometere do Latinobarómetroos percentuais de confiança/desconfiança dos governados com relação aos principais institutos do regime plutocrático-representativo: partidos políticos, Parlamentos, governos e Estados. A disposição da análise percorre: 1) o quadro da União Europeia (UE), com especial atenção para a região de origem latina; 2) os países latino-americanos, quando afunilaremos nossa análise para as maiores economias do território e, por fim, focaremos o contexto brasileiro. Depois de mensurarmos o grau de confiança dos eleitores com os institutos do regime plutocrático-representativo, poderemos avançar sem sobressaltos para o estudo da história dos votos descrença/desconfiança da representação-plutocrática, bem como para os índices de desemprego e de crescimento do PIB no Brasil. Com efeito, teremos aporte suficiente para correlacionarmos confiança dos eleitores, taxas de emprego, pujança da economia com votos nulos/abstenção/em branco. No bojo do texto, arrazoaremos a conjuntura permeada por explicações para os dados empíricos. Concluiremos o trabalho ratificando nossas teses. Vamos ao segundo passo.

 

AS BASES TEÓRICAS QUE SUSTENTAM O REGIME PLUTOCRÁTICO-RERESENTATIVO

Apresentaremos a seguir, um breve histórico dos significados do conceito de democracia com vistas a entendermos sua mudança ao longo do tempo e o seu significado atual, bastante diferente do conceito original. Essa transmutação tem contribuído para o consenso em torno da categoria, mas com díspares e por vezes antagônicas abordagens por distintos grupos políticos.

A tradição geral do pensamento ocidental, desde Platão e Aristóteles até o século XIX, vislumbrava a democracia como o governo dos pobres, dos ignorantes e incompetentes. A democracia era vista como uma ameaça de classe aos interesses dos superiores, logo incompatível com uma sociedade liberal e hierárquica. Portanto, liberalismo e democracia estavam em campos opostos e em constante conflito. Ela só foi aceita pelos liberais quando seus teóricos perceberam que a norma “um homem, um voto” não seria perigosa para a propriedade privada (Macpherson, 2003: 21), para os anseios do mercado, nem para a sociedade dividida em classes, (Kropotkin, 2005). Aprofundemos a discussão.

O modelo democrático dos antigos em Atenas possuía alguns institutos que se configuravam como a essência da democracia, como o sorteio para ocupação de cargos entre um grupo de voluntários, fato que negava automaticamente as eleições (Manin, 1997; Miguel, 2002; Rancière, 2014; Graeber, 2015). Assim sendo, a tiragem à sorte é de fato a forma normal da representação democrática e que afirma a igual capacidade de qualquer um para exercer o poder do povo, que não pode prolongar-se no tempo, nem dar a si mesmo uma legitimação própria (Rancière, 2014). Isto posto, o princípio fundamental da democracia é a ideia de um poder que não pode pertencer a ninguém e que não pode ser justificado em nome de nenhuma competência específica (Rancière, 2014). Por isso, a ideia de representação pelo sorteio e da rotação rápida.

Ao longo do tempo, os princípios democráticos foram substituídos por outros de origem oligárquica, como a representação e a eleição. A representação era originariamente, portanto, uma forma oligárquica, uma representação das minorias privilegiadas às quais os poderes soberanos reconheciam uma autoridade social (Rancière, 2014). Na Inglaterra, o costume de eleger representantes remontava pelo menos ao século XIII, tornando-se prática padrão que os homens, proprietários, escolhessem seus representantes parlamentares (Manin, 1997). Naquela época, nunca teria ocorrido a alguém que esse sistema tivesse alguma correlação com a democracia (Graeber, 2015).

Simultaneamente, a eleição no seu primeiro sentido não é a expressão de uma escolha, mas a manifestação de um consentimento que um poder superior requer e pretende que seja unânime (Rancière, 2014). As eleições eram consideradas uma extensão do sistema de governo monárquico. Os eleitos não governavam nada, coletiva ou individualmente; seu papel era falar em nome (representar) dos habitantes de seu distrito diante do rei para oferecer conselhos e sobretudo entregar os impostos de sua região (Graeber, 2015). As eleições, portanto, constituíam-se como a quintessência da seleção aristocrática de funcionários públicos. Com elas, escolhia-se quem acreditava-se ser o melhor candidato que, por sua vez, alegavam-se ser mais sábios que os demais. Esse é o real significado de aristocracia: governo dos melhores. As eleições eram o meio pelo qual os exércitos mercenários escolhiam seus comandantes, ou os nobres disputavam o apoio de futuros seguidores (Graeber, 2015).

Por esses motivos, na Idade Média, os movimentos populares revolucionários, como a Jacquerie (1358), Ciompi de Florença (1378) ou revolta dos camponeses da Inglaterra (1381), lutavam por igualdade social e/ou por nivelação da propriedade. Em nenhum momento lutavam por voto universal (Macpherson, 2003).

Segundo Wood (2003), no feudalismo seria impossível distribuir privilégio jurídico e direitos políticos sem transformar as relações sociais de propriedade existentes. Somente sob o capitalismo se tornou possível deixar intactas as relações de propriedade entre patrões e trabalhadores enquanto se permitia a democratização dos direitos políticos e civis. O que a autora busca nos dizer é que atualmente a democracia foi confinada a uma esfera política formalmente separada, enquanto a economia segue regras próprias.

O modelo de plutocracia que se instaura no século XX, ou democracia concorrencial (Schumpeter, 1942), encontra suas bases nas teorias de Mosca, Pareto, Ortega y Gasset (Miguel, 2002). Entretanto foi Schumpeter seu principal formulador.Para eles sempre existirá uma minoria dirigente e uma maioria dirigida. A desigualdade humana é mormente vista como natural e os homens que governam são os que possuem “vontade de poder” (Nietzsche, 1998), pertencem as elites e/ou possuem capacidades extraordinárias (Mosca, 1939; Pareto, 1935).

O modelo de Schumpeter transforma o processo eleitoral plutocrático-representativo na própria democracia, enquadrando, assim, perfeitamente os regimes políticos ocidentais (Miguel, 2002), sem que o povo governe ou tenha qualquer influência sobre as decisões políticas e muito menos econômicas realizadas no Estado.  Por conseguinte, a participação dos governados restringe-se apenas ao ato de votar e escolher membros de elite que vão lhes governar, sem que o eleitor tenha qualquer participação direta na escolha das leis ou de políticas públicas. O contexto de elaboração e popularização dessas teses aconteceu durante a década de 1940 e início da Guerra Fria, marcado dentre outras variáveis pela disputa em torno do conceito de democracia, pois os regimes do leste europeu em grande medida dirigidos pela antiga União Soviética também se apresentavam como democracias populares (Miguel, 2002). Neste diapasão, é apropriado o texto de Santos (2003) quando conclui que o século XX começou com uma grande dicotomia entre capitalismo e socialismo e terminou com um grande consenso: democracia.

O modelo de “democracia” schumpeteriana foi aprofundado e aprimorado por diferentes autores, como Seymour Lipset (1963), Samuel Huntington (1975) e Kurt Weyland, (2004), os quais defenderam que o regime democrático vai bem quando ocorre a baixa participação política dos governados, assim possuiria alto grau de aprovação. Nesse sentido, argumentam os autores, o excesso de participação aumenta os conflitos sociais e coloca demandas para o governo que ele não é capaz de atender. Huntington (1975) chegou a asseverar que cada vez que o Estado atende a uma demanda popular, incentiva novas e mais extravagantes. Então, para a estabilidade do sistema político, que deve estar imbuído do tecnicismo subordinado aos interesses do mercado mundial, é melhor que não se apresentem demandas para os governantes. Chomsky (2003: 29) chamou esse modelo de democracia do expectador e descreveu como essa condicionante foi posta em prática nos EUA nos anos de 1960, quando houve uma grande onda de insubmissão e a “classe especializada” se referia a esses acontecimentos como crise da democracia:

“A crise se devia ao fato de que amplos segmentos da população estavam se organizando, atuantes, e tentando ter voz ativa na arena política. Voltemos às duas concepções de democracia. Pela definição do dicionário, isso seria considerado um avanço democrático, mas, de acordo com a concepção predominante, era um problema, uma crise que teria que ser superada. A população teria que ser trazida de volta à apatia, obediência e passividade, que é o seu comportamento adequado”. 

Rancière (2014) aprofunda essas questões abordando outros aspectos:

Ora, o dado fundamental sobre o qual o consenso hoje repousa é o da condicionante econômica global, ou seja, o da lei do mercado mundial. Esta lei funciona de um duplo modo: por um lado, como o fato que exige que os governos adaptem os seus países a esta evolução. Por outro, como uma obrigação legal à qual os nossos governos obedecem como se obedecessem a uma obrigação estatutária ditada por instituições interestatais. Nos nossos países, este dado implica o acordo global dos partidos ditos de governo quanto a um programa comum de adaptação à livre concorrência que resulta, ele próprio, na destruição dos serviços públicos e dos sistemas de proteção social. Ele passa, fundamentalmente, a ideia de que a política é uma arte de gestão complicada em que o mais pequeno erro de cálculo é fatal para toda a coletividade. O que faz com que essa arte só possa ser exercida por uma elite especializada. Daí o reforço de uma oligarquia dirigista de políticos intersubstituíveis, estritamente ligada à oligarquia financeira dirigente, a grupos de especialistas que fornecem a justificação científica dos seus atos e a jornalistas e a intelectuais que os apresentam à opinião pública como inelutáveis. Assim sendo, a realidade do poder do povo vê-se cada vez mais reduzida aos períodos eleitorais, isto é, à escolha, de quatro em quatro anos, entre duas versões mais ou menos coloridas de um mesmo programa fundamental. Por conseguinte, qualquer forma de luta e de expressão popular que se afaste do sistema consensual é de imediato invalidada. 

O que o autor nos apresenta é que os governos devem seguir um pseudoconsenso estabelecido pelo mercado e seus agentes financeiros. Os interesses populares não são prioritários nesse processo. As questões econômicas estão blindadas por esse “consenso”. É exatamente por essas razões, dentre outras, que preferimos chamar esse regime por plutocrático (De Moraes, 2018).

Logo, as pseudodemocracias ocidentais contemporâneas transformaram em grande parte a esfera pública em questão privada: as decisões verdadeiramente importantes são tomadas em segredo e nos bastidores (do governo, do Parlamento, dos aparelhos dos partidos) (Castoriadis, 2002). Essa perspectiva difere fundamentalmente do real conceito de democracia que teoricamente pressupõe que a esfera pública pertença a todos e efetivamente esteja aberta à participação dos governados, que podem e devem autogovernar-se.

Tal como aconteceu com os regimes do leste europeu, antes da queda da URSS, que se auto-denominavam democracias, quando na verdade eram totalitários; os regimes ocidentais que também se autodenominam democracias, quando são antes plutocracias ou oligarquias, cujo funcionamento implica na constante rejeição: do poder do povo (Rancière, 2014) ou da autoinstituição social (Castoriadis, 1998). Esses regimes caracterizam-se pela sua reprodução e a instauração mundial de uma lei de mercado que exige governos de especialistas insensíveis aos desejos e à agitação dos governados, considerados ignorantes.

Aqui cabe trazermos uma reflexão de Graeber (2015) sobre a justificativa dos pais fundadores para a implementação da democracia nos EUA. Segundo ele, osfather fundationsdefendiam que a soberania pertence ao povo, mas este só pode exercê-la escolhendo membros, leia-se, homens brancos, das classes superiores para lhes governar. A justificativa pautava-se na ideia de que, tendo formação como advogados e por virem das classes ricas, eram mais sábios e mais capazes do que as próprias pessoas para compreender seus verdadeiros interesses. Em outras palavras, os governados, ignorantes, não sabiam seus próprios interesses, só os ricos, letrados, sabiam e por isso deviam governar.

Realidade é que os mecanismos de participação direta na elaboração das leis ou nas suas votações foram e são praticamente inexistentes para os governados, despossuídos de grande quantidade de capital. Na forma como o modelo está apresentado, resta aos eleitores a escolha de 2 em 2 anos daqueles que vão lhes governar, mas sem nenhum mecanismo que obrigue os governantes a cumprirem as promessas de campanha. A maior parte da população não tem tempo, dinheiro, organização e interesse para investir em campanhas eleitorais e/ou entrar em partidos políticos[6], normalmente dominados por oligarquias.

Podemos perceber que os princípios gerais do liberalismo estão empregados nos postulados que sustentam o que se convencionou chamar por democracia contemporânea. Normalmente, seus teóricos veem o regime plutocrático-representativo pela lente do mercado: os eleitores como consumidores, e os políticos, empreendedores. Seguindo os passos desses princípios, Robert Dahl (1971), Mancur Olson (1971) e Antony Downs (1958) estabeleceram as justificativas para a existência do que seria ou deveria ser o regime representativo chamado por eles de democrático ou de Poliarquia, no caso de Dahl, mas em comum nenhum deles apresentou mecanismos de controle dos governados sobre os governantes, tampouco de participação direta popular ou mesmo de igualdade econômica para potencializar a suposta igualdade política materializada na questão cada pessoa um voto.

Em epílogo, a democracia passa a ser uma competição entre elites. Esse arquétipo foi batizado por distintas denominações: democracia como equilíbrio (Machpherson, 2003), democracia de procedimentos (Castoriadis, 2002), democracia domesticada (Miguel, 2002), democracia do espectador (Chomsky, 2003). Ellen Wood (2003), por sua vez, chama a atenção para o fato de esse modelo deixar fundamentalmente intacta a exploração capitalista e, para além disso, viver em perfeita harmonia com ela. O autogoverno popular se constitui, para os seguidores de Schumpeter, como uma quimera inatingível.

Advertimos ao leitor que elaboraremos nossa pesquisa a partir de uma perspectiva exatamente oposta às teses hegemônicas na Ciência Política. Partimos do princípio segundo o qual, se a maioria dos governados não confia nos principais institutos do sistema plutocrático-representativo, significa que o modelo está em crise e precisa ser repensado. Seguimos os princípios segundo os quais as sociedades devem e podem auto-instituir-se (Castoriadis (1982) e que não existe nada perene. Nos propormos a colaborar para um diagnóstico dessa crise.

Apresentados em linhas gerais os postulados teóricos que sustentam o modelo liberal-representativo vigente, passemos para análise empírica de algumas surveysque mensuram a satisfação popular com seus principais institutos.

A DESCONFIANÇA NOS PRINCIPAIS INSTITUTOS DO SISTEMA PLUTOCRÁTICO-REPRESENTATIVO – UNIÃO EUROPEIA

O gráfico 1 mostra a média entre todos os países da União Europeia para as seguintes perguntas: 1) “Você tende a não confiar em partidos políticos” (linha verde); 2) “Você tende a confiar em partidos políticos” (vermelha); 3) a linha em laranja representa o “Não sabe responder a pergunta”.

 

GRÁFICO 1: CONFIANÇA EM PARTIDOS POLÍTICOS – MÉDIA ENTRE TODOS OS PAÍSES DA UNIÃO EUROPEIA. NOVEMBRO/2003-MAIO/2015.

Fonte: Eurobarometer, 2016

O gráfico histórico acima é autoexplicativo. Mostra claramente uma enorme desconfiança da população da União Europeia com relação aos partidos políticos, um dos principais institutos do regime plutocrático-representativo. Percebemos que a rejeição não é episódica ou conjuntural, mas se constitui como uma constante no século XXI, obtendo um leve aumento nos últimos anos.

Já o gráfico 2 diz respeito à última pesquisa disponível realizada pelo Eurobarometerem maio de 2015 para o critério de confiança em partidos políticos. Destarte, poderemos verificar individualmente e consolidar a constatação de que há uma rejeição generalizada, todavia com as idiossincrasias de cada unidade de análise. Percebemos que em todos os países da União Europeia mais de 50% das pessoas não confiam em partidos políticos, sendo que a média de desconfiança alcança os 77%; em alguns, atinge os 90%. Os países que mais confiam são: os nórdicos, Dinamarca, Finlândia, com forte tradição social-democrata associada com pouca desigualdade social, e a Turquia uma jovem democracia. Enquanto os que menos confiam são curiosamente: Grécia, considerada berço da democracia; República do Chipre, que foi colonizada pelos gregos; França, o primeiro país a garantir voto universal; e a Espanha, com seus sérios problemas de luta por independência de povos dentro de suas fronteiras.

 

GRÁFICO 2: CONFIANÇA EM PARTIDOS POLÍTICOS – TODOS OS PAÍSES DA UNIÃO EUROPEIA. MAIO/2015

Fonte: Eurobarometer, 2016

O gráfico 3 responde a mesma pergunta, porém inclui apenas os países latinos da Europa, os principais responsáveis pela colonização da América Latina. Percebamos que a rejeição aos partidos políticos é maior que a média da UE. Fato que abre brecha para entendermos esse fenômeno também por um veio culturalista.

GRÁFICO 3: CONFIANÇA EM PARTIDOS POLÍTICOS – PAÍSES LATINOS. MAIO/2015

Fonte: Eurobarometer, 2016

O gráfico 4 mostra o grau de confiança no parlamento com a média dos países da União Europeia. Percebemos que desde a primeira aferição, 11/2003, a distância entre um e outro tem aumentado significativamente, com uma única exceção para maio de 2007, ápice da aproximação entre as tendências. Não obstante, o gráfico mostra claramente que a desconfiança com relação ao parlamento é incontestavelmente superior, significando na prática que os governados não confiam nos seus supostos representantes.

 

GRÁFICO 4: CONFIANÇA NO PARLAMENTO NACIONAL – MÉDIA ENTRE TODOS OS PAÍSES DA UNIÃO EUROPEIA. NOVEMBRO/2003–MAIO/ 2015.

Fonte: Eurobarometer, 2016

 

O gráfico 5 descreve a insatisfação popular com o governo e já podemos perceber que ela é maior do que com relação ao parlamento. Talvez porque um grupo de governados possa se sentir representado por um ou outro parlamentar em função do atendimento de algumas demandas específicas. Sem embargo, a insatisfação com relação aos governantes é gritante na medida que menos de 30% dos pesquisados em média confiam nos governos, enquanto mais de 60% não confia.

 

GRÁFICO 5: CONFIANÇA NO GOVERNO NACIONAL – MÉDIA ENTRE TODOS OS PAÍSES DA UNIÃO EUROPEIA. NOVEMBRO/2003-MAIO/2015

Fonte: Eurobarometer, 2016

 

Com vistas a afunilar nossa questão, apresentamos um gráfico apenas com países europeus considerados latinos e mais influentes na nossa cultura. Eles possuem um grau de desconfiança aproximadamente 15% maior que a média da UE, chegando a 84% na Espanha e 76% em Portugal.

 

GRÁFICO 6: CONFIANÇA NO GOVERNO NACIONAL – PAÍSES LATINOS. NOVEMBRO/2003-MAIO/2015

Fonte: Eurobarometer, 2016

 

As demandas populares mais urgentes se mostram impermeáveis ao modelo plutocrático-representativo e não são atendidas – tal como, por exemplo, o combate ao desemprego, o acesso a produtos com preços “justos”, o combate à inflação, ou resolução de crises econômicas, conforme mostrado no gráfico a seguir.

 

GRÁFICO 7: PROBLEMAS URGENTES – MÉDIA UNIÃO EUROPEIA. NOVEMBRO/2003-MAIO/2015

Fonte: Eurobarometer, 2016

 

Os gráficos acima mostram que as principais demandas da população dizem respeito a aspectos de ordem econômica, estabelecidas a priori pelas leis do capitalismo, portanto, pouco modificáveis por governantes políticos comprometidos com a manutenção do establishment, como bem mostrou Rancière(2014).

Em resumo, podemos constatar que os principais institutos do modelo plutocrático-representativo passam por profundo descrédito junto aos governados na Europa. Também vimos que dentre eles, os países latinos desfrutam de uma desconfiança bem superior ao da média da UE. Ao mesmo tempo, as principais demandas dos governados dizem respeito a aspectos econômicos característicos da economia capitalista, portanto, pouco permeável para alteração via representantes na medida que os governos parecem presos por camisa de força que não contestam as leis do mercado e da financeirização (Chesnais, 2005; Graeber, 2015; Rancière, 2014).

Atentemos agora para o grau de desconfiança com relação às instituições representativas na América Latina.

 

A DESCONFIANÇA NOS PRINCIPAIS INSTITUTOS DO SISTEMA PLUTOCRÁTICO-REPRESENTATIVO – AMÉRICA LATINA

O gráfico 8 diz respeito à medial de todos os países da região. Notemos que, desde o início da aferição, elas apresentam uma certa constância: em 1996, 74,56%; chegando ao píncaro em 2001, com 86,31%; e, terminando, em 2015, com 78,17% de desconfiança com relação aos partidos políticos. As curvas para a variável relativa ao parlamento seguem praticamente o mesmo padrão da dos partidos políticos. O Latinobarómetrosó começou a fazer aferições para governo e Estado, respectivamente, em 2002 e 2010, e ambos também não desfrutam da confiança da maioria de seus governados, pois mais de 50% dos entrevistados desacreditam dessas instituições. Em comparação com os dados da União Europeia, os da América Latina são relativamente superiores, isto é, aqui se desconfia mais das instituições do regime plutocrático-representativo que na Europa. Não obstante, a suspeição segue praticamente o mesmo padrão dos países europeus de origem latina. Vejamos.

Fonte: Elaboração própria com base nos dados disponíveis pelo Latinobarómetro, 2015.

 

Agora, ampliamos a análise para outras instituições do Estado, somadas às duas mais influentes no mundo contemporâneo para efeito de formação da opinião pública: Igreja e Televisão. Testemunhemos que a entidade que as pessoas mais confiam é a Igreja, seguida por televisão e Forças Armadas. Esse dado talvez explique a ascensão cada vez mais comum de candidatos ligados a essas agremiações chegando ao poder por meio de voto. Por outro lado, os partidos políticos são os que as pessoas mais desconfiam, seguidos pelo Congresso e Poder Judiciário. Com exceção da Igreja e da Televisão, todas as outras instituições, que por sinal fazem parte do Estado, gozam da desconfiança da maioria dos governados, apresentando uma grande crise de legitimidade não apenas da representação na região, mas do próprio poder estatal. Vejamos.

Fonte: Elaboração própria com base nos dados disponíveis pelo Latinobarómetro, 2015.

 

O gráfico 10 diz respeito às principais potências da região. Notemos como o Brasil passa de país cuja desconfiança é a menor em 2010 para a segunda maior em 2015, saindo de 44% para 72%, configurando-se como um verdadeiro salto de incredulidade nas instituições plutocráticas-representativas.

QUADRO 10: DESCONFIANÇA COM RELAÇÃO AO ESTADO – POTÊNCIAS AMÉRICA LATINA

Fonte: Elaboração própria com base nos dados disponíveis pelo Latinobarómetro, 2015.

Circunstância equivalente acontece com relação aos partidos políticos. Na medial dos últimos 19 anos, o Brasil figurava como quarto país de maior desconfiança com relação aos partidos políticos. Vejamos que, após 2013, ele passa a ser o primeiro. Outro dado importante a se destacar é que a Venezuela deixa de ser o país com maior desconfiança em relação aos partidos políticos até 1998, ano da eleição de Hugo Chávez, e passa a ser na média o que mais confia desde então. A morte de Chávez em 2013 representa uma ascensão de 56% para 78%, entretanto, mesmo assim, ainda se confia mais lá do que em outros cinco países da região.

 

QUADRO 11: DESCONFIANÇA COM RELAÇÃO AOS PARTIDOS POLÍTICOS –POTÊNCIAS AMÉRICA LATINA

Fonte: Elaboração própria com base nos dados disponíveis pelo Latinobarómetro, 2015.

 

Situação muito semelhante acontece com relação ao Parlamento. Podemos usar a mesma explicação. Até porque o Congresso é formado por partidos políticos. E é natural que possuam as mesmas curvas com relação à desconfiança dos governados.

 

QUADRO 12: DESCONFIANÇA COM RELAÇÃO AO CONGRESSO – PRINCIPAIS POTÊNCIAS SUL-AMERICANAS

Fonte: Elaboração própria com base nos dados disponíveis pelo Latinobarómetro, 2015.

 

Ao perscrutar os dados relativos à América Latina sobre a crença nos principais institutos do modelo plutocrático-representativo, confirmamos a tendência do mundo ocidental, cujo oposto constitui-se como marca. Não obstante, dois casos chamaram a atenção nessa pesquisa comparada: Brasil e Venezuela.

Constatamos que comparativamente com outros países da América Latina, a população brasileira incrementa sobremaneira sua desesperança depois de 2013. Assim, podemos dizer que se trata de uma relação de causa/efeito com os protestos de junho daquele ano.

O país que mais tem adotado mecanismos de participação direta, como referendo, plebiscito, recall– caso da Venezuela, sob o governo Chávez[1]– é justamente o que possui o maior grau de confiança nas instituições. Curiosamente, depois da morte de Chávez, os referidos mecanismos não foram mais realizados no país e os índices de desconfiança também aumentaram. Os altos indicadores de crescimento econômico experimentados por esse país durante esse período, alimentado pelo alta do preço do petróleo (Weisbrot e Sandoval, 2007), também são fatores a se levar em conta. Essa credulidade é demostrada na análise histórica dentro do próprio país, pois quando tais institutos não eram assumidos, a desconfiança estava nos mesmos patamares dos demais países. Aqui pode estar uma importante pista de pesquisa, ao contrário, do que defendem os teóricos da democracia minimalista: a participação direta dos governados aumenta seu grau de confiança nas instituições.

Agora que já detectamos o grau de desconfiança dos governados com relação às principais instituições da plutocracia liberal (partidos políticos, Congresso Nacional e Governo Nacional), na Europa e na América Latina, podemos passar sem muitos espantos para análise dos resultados eleitorais brasileiros e em seguida ver se existe alguma correlação com a desconfiança popular e com os índices de crescimento econômico e de desemprego.

ANÁLISE DOS RESULTADOS ELEITORAIS NO BRASIL

Passemos aos resultados eleitorais em busca da resposta para a seguinte questão: existe alguma forma de explicar o crescimento de votos nulos, em branco e de abstenções?

Comecemos pelo exame comparado das eleições presidenciais entre 1989 e 2014, por meio de gráficos, privilegiando o Rio de Janeiro, estado no qual a Revolta dos Governados foi mais intensa e duradoura.

 

GRÁFICO 13: VOTOS 1º TURNO ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS (1989) BRASIL

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do TSE (Tribunal superior eleitoral).

GRÁFICO 14: VOTOS 1º TURNO ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS (2014) BRASIL

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do TSE

 

Nos gráficos acima temos os resultados do primeiro turno das eleições de 1989 e 2014. Observemos que a opção pela negação da representação-plutocrática fica em segundo lugar nos dois pleitos, sendo significativamente maior em 2014.[1]O gráfico 15 ilustra essa argumentação com mais clareza. Vejamos.

 

GRÁFICO 15: CANDIDATO VENCEDOR X DESCRENÇA/NEGAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO-PLUTOCRÁTICA – BRASIL ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS 1989-2014 (1º TURNO)

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do TSE

 

No segundo turno das eleições presidenciais, o cenário não muda. Percebemos que em 2006 houve um declínio da descrença/negação da representação-plutocrática e, em 2014, crescimento.

 

GRÁFICO: 16 – DESCRENÇA/NEGAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO-PLUTOCRÁTICA – ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS – 2º TURNO – ABRANGÊNCIA BRASIL

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do TSE (Tribunal superior eleitoral).

 

DESCRENÇA/NEGAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO-PLUTOCRÁTICA NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS

Passemos para o estudo das eleições no estado do Rio de Janeiro. Nesse estado, a descrença/negação da representação-plutocrática foi a mais emblemática do Brasil, pois no primeiro turno foi maior inclusive do que a quantidade de votos da candidata vencedora, por mais de 750 mil votos.[1]

 

GRÁFICO 17: VOTOS 1º TURNO ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS DE 2014 RIO DE JANEIRO

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do TSE (Tribunal superior eleitoral) e do TRE/RJ (Tribunal Regional Eleitoral).

No segundo turno das eleições presidenciais no Rio de Janeiro, a opção descrença/negação da representação-plutocrática não só fica na frente do candidato Aécio Neves do PSDB novamente, como ainda ganha em torno de 200 mil novos adeptos, mas perde para a candidata vencedora, Dilma Rousseff.

 

GRÁFICO 18: VOTOS 2º TURNO ELEIÇÕES 2014 RIO DE JANEIRO

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do TSE (Tribunal superior eleitoral) e/ou do TRE/RJ (Tribunal Regional Eleitoral).

 

É mister destacar que nas eleições presidenciais de 2014 o estado do Rio de Janeiro teve o maior número de votos nulos, em branco e abstenções da federação. Por fim, é possível perceber pelo gráfico abaixo o salto que o voto descrença/negação da representação-plutocrática dá nessas eleições, alcançando seu maior índice da história política recente.

 

GRÁFICO 19: PERCENTUAL DESCRENÇA/NEGAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO-PLUTOCRÁTICA PARA PRESIDENTE DA REPÚBLICA NO RIO DE JANEIRO

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do TSE (Tribunal superior eleitoral) e/ou do TRE/RJ (Tribunal Regional Eleitoral).

              

              O gráfico abaixo confirma que historicamente a soma dos votos nulos, em branco e abstenções no Brasil e no Rio de Janeiro caminhavam simultaneamente com as mesmas curvas, praticamente se igualando em 2006 e 2010. Não obstante, em 2014, podemos perceber um ponto fora da curva, isto é, enquanto entre 1989 e 2004 o Rio de Janeiro obteve menos votos dessa natureza do que no âmbito nacional, nos pleitos de 2006 e 2010 os pontos se igualam. Entretanto, em 2014, no Rio de Janeiro a variável se descola da média brasileira pela primeira vez na história e justamente após 2013, embora no âmbito brasileiro também apontasse a tendência de crescimento.

GRÁFICO 20: DESCRENÇA/NEGAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO-PLUTOCRÁTICA: BRASIL X RIO DE JANEIRO – ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS – 1º TURNO

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do TSE (Tribunal superior eleitoral) e/ou do TRE/RJ (Tribunal Regional Eleitoral).

Expostos os dados eleitorais da corrida para a presidência da república, saltam aos nossos olhos uma constatação e uma pergunta: 1998 e 2014 alcançam a cúspide da descrença/negação da representação-plutocrática. Como explicar isso?

Em 1989, a opção pela descrença/negação da representação-plutocrática foi a menor desde que as eleições são diretas e universais no Brasil. Portanto foi quando o candidato vencedor ganhou com a maior margem de diferença. Entendemos que naquelas eleições presidenciais, as primeiras após a ditadura militar-plutocrática-desavergonhada[1], a esperança de mudança era muito grande e os partidos ainda se mostravam com diferenças ideológicas significativas. Em resumo, havia uma crença considerável dos governados, segundo a qual era possível fazer grandes transformações sociais a partir da eleição de uma determinada candidatura. Na medida que essas diferenças vão acabando, o eleitorado percebe: 1) os acordos espúrios entre diferentes partidos de colorações ideológicas distintas; 2) as obras superfaturadas no exercício do poder público[2]; 3) o descarado descumprimento das promessas de campanha. Esses aspectos em seu conjunto colaboram para que os governados se desencantem da participação na política eleitoral. Como reflexo, acontece o aumento do desprezo e concomitantemente cresce o voto de protesto contra tudo e contra todos.

O ápice desse processo aconteceu em 1998, quando da reeleição de Fernando Henrique Cardoso, que foi reconduzido ao Planalto com menos votos que a soma dos votos nulos, em branco e abstenções. Isso simplesmente significa dizer que o presidente foi reeleito sem que a maioria da população o escolhesse. Do ponto de vista etimológico da palavra democracia, que deve pressupor pelo menos o consentimento da maioria, talvez esse seja o sinal mais evidente de uma crise de legitimidade do seu uso.

Os anos 1990 no Brasil foram avassaladores neoliberais, com desmonte do pouco de estado social, privatizações em série e ataque aos direitos trabalhistas e previdenciários, marcado pela ideia amplamente divulgada pelos oligopólios de comunicação de massa, segundo a qual era impossível lutar contra as forças do mercado, chamada por globalização.

A descrença/negação da política eleitoral entra em declínio novamente quando esperanças são renovadas em 2002 com a possibilidade de vitória de Luís Inácio Lula da Silva, permitindo, pela primeira vez, que um operário, nordestino, com trajetória sindicalista, representando um partido com histórico de esquerda, assumisse a presidência da República no Brasil. Foi um voto amparado em muitos movimentos sociais e com a clara rejeição ao neoliberalismo. Depois da transformação e ampliação do bolsa-escola em bolsa-família, atendendo a milhões de brasileiros miseráveis e pobres, Lula foi reeleito com dilatação da diferença de seus votos com relação aos da descrença/negação da representação-plutocrática. Esse patamar tem um leve declínio em 2010 com a eleição de Dilma Rousseff e voltou a atingir números alarmantes em 2014. Para melhor entender esse crescimento é de fundamental importância levar em conta as características da Revolta dos Governados de 2013, marcado pela negação de todos os partidos políticos e por consequência uma forte crítica ao modelo plutocrático-representativo.

Fato é que grande parte da população que já havia se descontentado com o modelo do PSDB de governar em 1998 e por isso votou em Lula em 2002, agora também esgotara sua tolerância com o PT, depois de 13 anos sob seus governos, fortemente marcados pela corrupção que outrora criticara.

Passemos agora para a análise dos votos para o governo do estado do Rio de Janeiro, com os quais poderemos ratificar a tendência supracitada.

DESCRENÇA/NEGAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO-PLUTOCRÁTICA NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – ELEIÇÕES FLUMINENSES

No início da década de 1980, a tendência da descrença/negação da representação-plutocrática era bem pequena. Ela começa a crescer nos anos 1990, enquadrada na tendência nacional. A forma de ler pode ser a mesma, implementação de políticas públicas de caráter neoclássica, crise econômica, alta do desemprego e baixíssimo crescimento do PIB, caminhavam concomitante com uma descrença nas eleições/representações-plutocráticas e nas políticas partidárias. Ademais, os discursos políticos se afunilavam para soluções liberalizantes, formados por um consenso pró-mercado e, por consequência, anti-social. Esses fatores em seu conjunto podem ajudar a explicar o exorbitante crescimento da descrença/negação da representação-plutocrática no Rio de Janeiro.

Compreendamos no gráfico abaixo que o menor índice de abstenção aconteceu em 1986. Tratou-se de uma eleição, no estado, praticamente plebiscitária, na qual estavam em disputa uma perspectiva do brizolismo com forte ênfase na educação com a candidatura de Darcy Ribeiro e, por outro lado, a candidatura do governo federal representada por Moreira Franco. Exatamente antes das eleições, o presidente da república sancionou o plano cruzado que ganhou uma popularidade enorme, sobretudo, porque congelou os preços dos produtos e ainda concedeu um aumento salarial aos trabalhadores. O consumo alcançou altos patamares. Dessa maneira, o PMDB, partido governista, sagrou-se vencedor em todos os estados da federação com exceção de Sergipe. Mesmo no caso particular do Rio de Janeiro, no qual o governo Brizola tinha grande popularidade, não foi capaz de impedir a vitória do candidato do plano cruzado. Uma explicação plausível foi de que a contenção da inflação sem redução de salários e com aumento do consumo e do poder de compra elegeu o candidato do governo federal. Porém, pouco tempo depois das eleições, o plano econômico fracassou solenemente.

Em 1986, portanto, a adesão popular ao modelo representativo-plutocrático no Rio de Janeiro alcançou seu paroxismo com um número mínimo de votos descrença/negação da representação-plutocrática. É importante salientar que se tratou da primeira eleição após o fim da ditadura militar-plutocrática desavergonhada na qual as esperanças de uma vida melhor menos militarizada estavam em alta. Esses dados nos permitem inferir que a participação eleitoral está diretamente associada à esperança social com as ações/políticas públicas do governo.

Situação oposta começou a vigorar a partir de 1990 depois da majestosa decepção de 1986, quando o plano cruzado foi interpretado como uma grande fraude eleitoral. Nos pleitos subsequentes, a insatisfação com as eleições se mostrou bastante ampla. Entre 1990 e 1998, a soma da negação da representação-plutocrática apresentou-se em contínuo crescimento alcançando patamares extraordinários. Foram exatamente os anos neoliberais que no Rio de Janeiro gerou, além dos problemas supracitados, violência social e guerra nas favelas.

Ao analisar as eleições de 2002, o voto descrença/negação da representação-plutocrática passa por um considerável declínio, diminuindo quase em um terço suas taxas. As eleições estaduais no Rio de Janeiro são historicamente ligadas ao contexto nacional. As esperanças de profunda mudança de rumo das políticas econômica, social, cultural, educacional, de saúde, emprego etc em nível nacional servem como estímulo para se voltar a acreditar ou pelo menos diminuir a aversão e o desprezo pela representação.

A partir de 2006 as taxas voltam a crescer continuamente. A chave explicativa que encontramos é associá-la novamente a crescente decepção com o modo petista de governar e de seus aliados no estado do Rio de Janeiro, representados na candidatura de Sérgio Cabral.[3]O governo petista sofria as críticas de corrupção chamadas por “mensalão” e, nesse sentido, aquilo que havia se transformado em esperança com novos rumos do país virou decepção. A população foi percebendo que os governos petistas e de seus aliados não se diferenciavam consideravelmente do modelo do PSDB, que o Rio de Janeiro historicamente rejeitou.

GRÁFICO 21: HISTÓRICO DESCRENÇA/NEGAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO-PLUTOCRÁTICA – ELEIÇÕES GOVERNADOR RJ -1982-2014 (1º TURNO) – percentual x ano eleitoral

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do TSE (Tribunal superior eleitoral) e/ou do TRE/RJ (Tribunal Regional Eleitoral) e Nicolau, 1998.

 

O gráfico acima mostra o histórico da descrença/negação da representação-plutocrática para as eleições de governador no Rio de Janeiro. O ápice desse processo aconteceu em 2014, quando chegou a 40%. Ademais, é possível perceber que nos anos 1990, tipicamente neoliberais, ocorreu um substantivo aumento da rejeição aos institutos plutocráticos-representativos.

Vejamos no quadro abaixo que, pela primeira vez na história recente das eleições pós-ditadura militar-plutocrática desavergonhada, o governador foi eleito com menos votos do que a soma dos votos nulos, em branco e das abstenções. [1]

GRÁFICO 22: CANDIDATO ELEITO X DESCRENÇA/NEGAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO-PLUTOCRÁTICA – 2º TURNO ELEIÇÕES – GOVERNADOR RIO DE JANEIRO – percentual x ano eleitoral

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do TSE (Tribunal superior eleitoral) e/ou do TRE/RJ (Tribunal Regional Eleitoral).

 

 

Sustentamos a hipótese de que esse resultado aconteceu exatamente em função de o Rio de Janeiro ter sido protagonista da maior intensidade e durabilidade da Revolta dos Governados de 2013 com caráter bastante anti-institucional e por consequência insurgente, semelhante aos termos colocados por Inglehart (2000), Norris (1999) e Dalton (2000) que atribuem a descrença com relação às eleições aos pós-materialistas na Europa, como veremos à frente.

Esse episódio aberrante aconteceuem meio a maior campanha pelo voto levada a cabo pelos oligopólios de comunicação de massa, que inclusive sequer citavam os números para votos nulos, em branco e de abstenções.[1]Por outro lado, diversos coletivos políticos autonomistas, anarquistas e socialistas não institucionais fizeram campanha pela não escolha de qualquer candidato para as eleições, apresentando uma crítica contundente ao modelo como um todo.[2]

Por isso, o vértice desse processo acontece exatamente em 2014, logo após o maior levante popular da história do Rio de Janeiro, quando esses grupos ganham maior aderência e visibilidade. Uma das principais características dos insurgentes era negar os partidos políticos e a sua suposta representação, apresentando-a como uma farsa. Ademais, a Revolta no Rio de Janeiro foi a mais duradoura do Brasil com as maiores manifestações.[3]

 

DESCRENÇA/NEGAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO-PLUTOCRÁTICA NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO – ELEIÇÕES CARIOCAS

Nas eleições de 2016 para a prefeitura da capital do Estado do Rio de Janeiro, ocorreu a acentuação da tendência amplificada após 2013. Com efeito, perceberemos no gráfico abaixo que, pela primeira vez na História, o candidato vencedor alcançou menos votos que a soma da descrença/negação da representação-plutocrática.

GRÁFICO 23: CANDIDATO VENCEDOR X DESCRENÇA/NEGAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO-PLUTOCRÁTICA – PREFEITURA CIDADE RIO DE JANEIRO.[4]

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do TRE/RJ (Tribunal Regional Eleitoral).

 

A título de informação, no estado do Rio de Janeiro, em seis dos oito municípios que tiveram segundo turno, a descrença/negação da representação-plutocrática teve mais votos do que o candidato vencedor. Foram os casos de São Gonçalo (segundo maior colégio eleitoral do estado), Niterói, Duque de Caxias, Petrópolis e Belford Roxo. Somente em Nova Iguaçu e Volta Redonda os candidatos vencedores tiveram mais votos que a descrença/negação da representação-plutocrática. Não obstante, esse não foi um fenômeno exclusivo do Rio de Janeiro. A negação da representação-plutocrática superou o primeiro colocado em outras nove capitais do país: São Paulo (SP), Belo Horizonte (MG), Porto Alegre (RS), Curitiba (PR), Cuiabá (MT), Aracaju (SE) e Belém (PA), Campo Grande (MS), Porto Velho (RO). Em outras onze capitais, a descrença/negação da representação-plutocrática ficou na frente do candidato segundo colocado, são elas:  Recife (PE), Salvador (BA) Florianópolis (SC), Goiânia (GO), Natal (RN), São Luis (MA), Fortaleza (CE), Palmas (TO), Maceió (AL), Macapá (AP) e Boa Vista (RO).

 

DESCONFIANÇA NOS PRINCIPAIS INSTITUTOS DO SISTEMA PLUTOCRÁTICO-REPRESENTATIVO – BRASIL

Passemos à apreciação que correlaciona votos nulos, em branco e abstenções com altos índices de desemprego, baixo crescimento econômico e insatisfação social com a economia, distribuição de renda e solidariedade com pobres e miseráveis. Comecemos.

Percebamos no gráfico abaixo que a desconfiança com relação aos partidos políticos e ao Congresso Nacional é uma constante na história recente brasileira, possuindo uma média de 80% e 70%, respectivamente. Não obstante, os maiores patamares da série histórica ocorreram justamente após os protestos de 2013, depois de um leve declínio em 2010. É alarmante o quadro de descrença dos governados com relação aos partidos políticos, chegando a quase 90% em 2015. Com relação ao Congresso, chega ao segundo maior patamar na série histórica e alcança o ápice de todo o período pesquisado respectivamente.[1]Esse aumento generalizado da suspeição com relação às instituições do sistema plutocrático-representativo pode explicar em parte o processo de impeachmentsofrido pela então presidente da República, Dilma Rousseff. Parte da oposição aproveitou-se desse clima negativo com relação à política institucional em geral e desencadeou a retirada da presidente da República.[2]

GRÁFICO 24: PERCENTUAL DE DESCONFIANÇA DOS GOVERNADOS NOS PARTIDOS POLÍTICOS E NO CONGRESSO BRASIL

Fonte: Elaboração própria com base nos dados disponíveis pelo Latinobarómetro, 2016.

O gráfico 25 mostra claramente que as pessoas deixaram as ruas em 2013, mas não deixaram de desconfiar dos governantes políticos. Podemos perceber que o grau de desconfiança de 2015 se equivale ao da final da década de 1990 e 2002, ano que a maior parte da população elegeu Lula da Silva pela primeira vez para o Executivo nacional, mostrando um grande descontentamento com o modelo do PSDB de governar e ao mesmo tempo apostando em alternativa que se apresentasse como oposição. Os anos finais do século XX e do início do XXI são de grande descontentamento com o governo federal. Ponto que facilita a chegada ao poder de Lula, depois da qual o grau de desalento cai continuamente e fica praticamente constante até 2013, quando o quadro muda abruptamente e chega ao maior patamar histórico, na aferição posterior, em 2015. Vejamos que em 2013, antes dos protestos, o percentual de pessoas que não possuía nenhuma confiança no governo era de aproximadamente 25%, saltando para 42% na aferição seguinte, em 2015.

GRAFÍCO 25: PERCENTUAL DE DESCONFIANÇA NO GOVERNO – BRASIL

Fonte: Latinobarómetro, 2016. Ver: http://www.latinobarometro.org/lat.jsp

 

Por fim, é importante reter que detectamos dois extremos da variável “nenhuma confiança no governo” na série histórica marcados por altos percentuais: A) final da década de 1990 até 2002; B) 2015. Como explicar tamanha desconfiança?

Com vistas a ampliar nossa análise, vejamos dois indicadores fundamentais da economia brasileira: crescimento do PIB e do desemprego.

É fundamental perceber nos gráficos abaixo – se analisarmos apenas os anos eleitorais – que os piores desempenhos do PIB foram exatamente em 1998 e 2014, seguido de perto por 2002. Nesses anos as opções descrença/negação da representação-plutocrática foram as maiores e, em 2002, em particular, o eleitorado decidiu retirar o PSDB do poder e colocar um partido que se apresentava como oposição e crítico das políticas adotadas por aquele, o PT. Assim, detectamos uma relação direta entre baixo crescimento do PIB, insatisfação popular e quantidade de votos brancos, nulos e abstenções.

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do IBGE que aparecem por trimestre, alteramos e colocamos por anos.

Fonte: Elaboração própria com base nos dados do IBGE.

Se procuramos explicações para o crescimento dos votos descrença/negação da representação-plutocrática para os anos de 1998 e 2014 as taxas de desemprego casadas com os outros gráficos podem nos ajudar. Ressalvamos que percebemos duas tendências caracterizadas pela correlação entre crescimento/diminuição simultâneo do número de desempregados com a quantidade dos votos nulos, em branco e abstenções.

O primeiro grande salto dessas taxas aconteceu justamente de 1997 para 1998, quando subiu quase dois pontos percentuais, constituindo-se como a maior ascensão em todo o período apresentado. É mister destacar que o ano de 1998 não foi apenas de crise do desemprego, mas também um dos exemplos mais baixos de crescimento do PIB no Brasil, superado apenas por 2015, quando o crescimento foi negativo, e por 1999, ambos anos não-eleitorais, como já mostrados. No ano eleitoral de 2002, também percebemos um crescimento significativo dos indicadores de desemprego que resultou na substituição do PSDB pelo PT no comando da governança política nacional. Nos anos eleitorais de 2006 e 2010, marcados pelo crescimento/estabilidade do PIB, resultou automaticamente na diminuição dos votos descrença/negação da representação-plutocrática.

O gráfico 27 apresenta a percepção dos entrevistados sobre os rumos da economia brasileira. Mais uma vez, a percepção popular coincide com os números reais mostrados acima e, a nosso ver, resulta no incremento da descrença/negação da representação-plutocrática, pois, se mirarmos somente nos anos de eleições, veremos que justamente o de 1998 alcança o topo de percepção ruim. Infelizmente, não foi realizada aferição em 2014, mas se imaginarmos 2015 como mais próximo ou mesmo uma média com 2013, perceberemos que 2014 seria outro ano propício para uma percepção negativa para o governo, bem como para todos os políticos.

GRÁFICO 28: RUMOS DA ECONOMIA BRASIL: PERCENTUAL RUIM E MUITO RUIM

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do Latinobarómetro (2016).

O gráfico 28 diz respeito a percepção que os entrevistados possuem acerca da distribuição de renda no Brasil. Somamos as variáveis daqueles que a consideravam injusta e muito injusta. Vejamos que os maiores índices acontecem precisamente em 1997 e 2015 com 91%. Como não tivemos aferição nos anos de 1998 e de 2014, podemos considerar 1997 e 2015 como parâmetros e perceber que emparelham perfeitamente com as datas de maiores percentuais de votos descrença/negação da representação-plutocrática. Vejamos.

GRÁFICO 29: PERCEPÇAO POPULAR DA DISTRIBUIÇÃO DE RENDA NO BRASIL COMO INJUSTA OU MUITO INJUSTA

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do Latinobarómetro (2016)

A representação abaixo é o resultado da seguinte pergunta: Até que ponto a solidariedade com os pobres e necessitados é garantida em seu país? Entendamos que a avaliação negativa cresce substantivamente em todos os sentidos e alcança seu ápice justamente em 2015. Fato que reforça nossa ideia de descontentamento com os governantes impulsionadas depois de 2013. [1]

GRÁFICO 30: SOLIDARIEDADE COM OS POBRES E NECESSITADOS

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do Latinobarómetro (2016)

Como induzimos, os gráficos acima apontam para a possibilidade de encontrar uma explicação para o píncaro de votos negação/descrença no representação-plutocrática nos anos de 1998 e 2014. Essa explicação pode ser correlacionada com os altos números de desemprego, com os incrementos de percepção negativa com relação as ações dos governantes, mas sobretudo com os péssimos indicadores de crescimento do PIB.

Por fim, com os dados apresentados até aqui, constatamos as seguintes questões: 1) o modelo Plutocrático-Representativo passa por uma profunda rejeição/falta de aderência pela maior parte dos governados no mundo ocidental, no qual Brasil e Rio de Janeiro estão inseridos; 2) a expressiva quantidade de votos descrença/negação da representação-plutocrática está associada a ciclos de satisfação/esperança da sociedade com o crescimento econômico e/ou melhores condições de vida; 3) tudo indica que os protestos de 2013 influenciaram e/ou foram resultado do crescimento da descrença generalizada com os partidos políticos, parlamentares e governos em geral que, por sua vez, estão associados ao crescimento dos votos nulos, em branco e abstenções; 4) justamente quando ocorreu um aumento significativo dos índices de desemprego e de declínio do crescimento econômico os votos descrença/negação da representação-plutocrática também cresceram.

Passemos agora a explicar o auge da crise da representação e sua relação com os novos movimentos sociais.

 

V. NOVOS MOVIMENTOS SOCIAIS E A CRISE DA REPRESENTAÇÃO

Em função da crise das instituições representativas, dá-se importância a mudanças de valores de parcela da sociedade frente aos bens materiais. É o que Inglehart, Dalton e outros entendem como fenômeno resultado das concepções pós-materialistas. Vamos a eles.

Segundo Norris (1999), amparada em tese de Inglehart, os pós-materialistas acreditam em formas de engajamento político via novos movimentos sociais e ação direta, ao invés de velhos canais de representação via partidos políticos e grupos de interesse.[1]

O objetivo do trabalho de Dalton, por sua vez, é demonstrar o impacto da tese das mudanças de valores e suas implicações para o funcionamento das democracias contemporâneas. Na visão deste autor, os pós-materialistas são mais exigentes em relação ao governo, querem proteção ambiental, direito das mulheres, novas oportunidades para os mais pobres etc. Essa parcela da sociedade critica o status quo, não confia nas instituições representativas, condena veementemente a hierarquia, confia mais em sindicatos e movimentos sociais não institucionalizados (Dalton 2000a)[2]

Destarte, essa parcela da população muda os critérios de avaliação das instituições históricas e basilares da plutocracia representativa, resultando em uma crescente queda na avaliação positiva percebida atualmente.

Segundo surveyrealizada na Alemanha e na Grã-Bretanha, os pós-materialistas querem menos investimentos em segurança pública, na defesa nacional e assistência para o comércio e a indústria, conquanto querem prioridade para a ajuda a outros países (mais pobres), para a educação, arte e cultura (Dalton, 2000a). Gastar com educação e países pobres (aqui subjacente a ideia de gastos com distribuição de renda) e não gastar com segurança, nem com financiamento às empresas privadas, pode demonstrar a pouca preocupação com a propriedade privada e muito menos com os empresários – e seus lucros -, caracterizando uma agenda próxima daquilo que socialistas pregam ou até uma agenda historicamente de esquerda, mas não dos partidos que assumiram o poder em diversas partes do mundo ocidental sob este estigma.

Concordamos em parte com as reflexões de Dalton, Inglehart e Norris, as quais podem nos ajudar a decifrar o crescimento da descrença/negação da representação-plutocrática no Brasil. Confluímos que ocorre o aumento na sociedade do número de pessoas que não acredita nas instituições do modelo plutocrático-representativo. Contudo, podemos denominar os adeptos da ação direta, que condenam as hierarquias, cujas preocupações prioritárias se voltam para investimento em educação, saúde, moradia, e ajuda aos países pobres por outros nomes. Essas são pautas dos setores considerados revolucionários, que também criticam os partidos políticos institucionalizados, considerados de esquerda, e se materializaram em diversos movimentos nos últimos anos, como a Ação Global dos Povos (Justiça Global), os Indignados na Espanha, o Occupynos EUA, a chamada Primavera Árabe, os Zapatistas e o Movimento de Oaxaca no México dentre outros. O que tem de novo nesses setores é que muitos deixaram de confiar nas instituições do regime plutocrático-representativo, outros nunca confiaram. 2013 no Brasil teve muito dessas características com maior força no Rio de Janeiro, o que resultou no paroxismo da negação da representação-plutocrática, consubstanciando em opção política deveras politizada, fruto de fatores como: 1) participação nos protestos de 2013 e contato com coletivos políticos não institucionalizados; 2) crise econômica e de desemprego. Não obstante, é importante destacar que a descrença/negação da representação-plutocrática é uma constante na política brasileira, todavia foi acentuada após 2013 quando ganhou novos adeptos.[3]

 

CONCLUSÃO

O tratamento dos dados apresentados nos permite chegar a algumas conclusões importantes. A principal delas é: se não compartilhamos com a perspectiva da democracia concorrencial schumpeteriana, tampouco com as teses de Lipset, Huntington e Weyland, e confiamos nas pesquisas do Eurobarometer, do Latinobarómetro, nos dados estatísticos do IBGE, bem como nos resultados eleitorais no Brasil, só podemos concluir que o modelo plutocrático-representativo padece de profunda crise por uma constatação muito óbvia: a ampla maioria dos governados não confia nas suas principais instituições.

Em outras palavras, todas as pesquisas confirmam que a ampla maioria das pessoas não confia nos partidos políticos, nos parlamentares, nos governos, em resumo, nos políticos em geral e nas suas agremiações. Mostramos que essa desconfiança é uma marca do século XXI, seja na Europa, na América Latina, no Brasil e no Rio de Janeiro.

Vimos também que o modelo existente chamado por antífrase por democracia se baseia na ideia elitista, segundo a qual as massas precisam ser governadas porque são incapazes para o autogoverno. Assim, o sentido etimológico da palavra democracia está muito distante da realidade, pois a regra constitui-se em uma minoria, em defesa de seus interesses, governar os demais. Por isso, nos negamos a usar o conceito de democracia para caracterizar o regime plutocrático-representativo existente.

A partir do cruzamento dos gráficos – do IBGE, sobre o desempenho do PIB e taxas de desemprego; e de opinião pública, do Latinobarómetro– também percebemos que em momento de grande crise econômica, de altos índices de desemprego e de desesperança generalizada, a descrença/negação da representação-plutocrática aumenta substantivamente, sendo o oposto também verdade.

A partir da experiência pormenorizada do Rio de Janeiro apreendemos que justamente após os maiores protestos da história, cuja marca indelével foi a negação de todos os partidos e políticos em geral, ocorreu o apogeu dos votos nulos, em branco e de abstenções. Assim, podemos afirmar que esse fenômeno acontece em função de uma nova cultura que Dalton (2000) atribuiu aos pós-materialistas nos países da OCDE, nós entendemos que no Brasil esteve ligada estritamente aos protestos de 2013, sendo um de seus principais resultados.

Em vista disso, podemos ler a descrença/negação da representação-plutocrática, precipuamente como ação intencional do eleitor que demonstra sua insatisfação com os governos, os partidos políticos, os parlamentares e também com o desempenho econômico e social do país, pois justamente nos períodos eleitorais de crise aguda, 2014 e 1998, a quantidade de não votos em candidatos alcançou os maiores patamares.Portanto, esses aspectos inviabilizam entendê-los como mera apatia, erros ou algo equivalente. Simultaneamente, por outro lado, quando os índices de crescimento econômico e melhoras sociais estão em alta, as pessoas tendem a votar e a confiar mais nas instituições.[4]

Dentre os vários aspectos que colaboram para a desconfiança dos governados com relação à participação eleitoral está a questão da independência política que o regime tem diante das ingerências econômicas, isto é, a desigualdade e a exploração econômicas convivem perfeitamente bem com o regime chamado de democrático (Macpherson, 2003; Wood, 1995; Graeber, 2015, Rancière, 2014; Castoriadis, 2002) Com efeito, cada vez mais os governados percebem que seu voto pouco importa para um sistema sob os ditames do capital. Nos termos de Chomsky (2003: 26): “a maioria da população nem ao menos se anima a votar porque soa inútil”.

Com base nas pesquisas arroladas nesse paper, descartamos facilmente as justificativas para crescimento da descrença/negação da representação-plutocrática como resultado de equívocos de cadastro, de desatualização de listas eleitorais ou erros oriundos de pouca familiaridade dos eleitores com a urna eletrônica, como alguns jornalistas tentaram justificar. Ao contrário, a partir do grau de desconfiança com as principais instituições do regime plutocrático-representativo seria fácil de esperar que a maior parte da população não tivesse interesse em escolher qualquer candidato para representá-la. Com base neste cenário, inclusive, a pergunta deveria ser oposta: como um grande número de pessoas ainda vai às urnas escolher um representante de um partido político que ele não confia? Em outras palavras, o espanto não deveria acontecer com os votos nulos, em branco ou as abstenções, mas com o fato de tantas pessoas irem, ainda, votar.

Para concluir citamos Guy Debord (1997): “a ideologia da democracia nada mais é do que a liberdade ditatorial do mercado, temperada pelos direitos do homem espectador”.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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INSTITUTOS DE PESQUISA DE OPINIÃO PÚBLICA PESQUISADOS:

EUROBAROMETER http://ec.europa.eu/public_opinion/index_en.htm

LATINOBARÓMETRO http://www.latinobarometro.org/lat.jsp

IBGE: http://www.ibge.gov.br/home/



[1]A teoria dos pós-materialistas de Inglehart sugere que a mudança de valor nas sociedades pós-industriais tem desenvolvido a formação de muitos cidadãos críticos que questionam os modelos tradicionais de autoridade, refletindo em aumento da descrença nas instituições do modelo liberal-representativo.

[2]Dentre as seguintes instituições: políticos, militares, polícia, sistema legal, serviço civil, Parlamento, Igreja, imprensa, empresários e sindicatos – todos ganham avaliação negativa junto aos pós-materialistas, com exceção dos sindicatos, sendo que os militares e os políticos têm a pior avaliação (Dalton, 2000)

[3]Atualmente, podemos entender que as escolas e universidades ocupadas no Brasil são uma expressão dessa nova geração que deseja ação direta e relações horizontais e desacredita da representação tradicional e de suas instituições.

[4]Para esse aspecto o caso da Venezuela é exemplar, pois sob o governo Chávez, quando foram adotados diversos instrumentos de participação direta da população como referendos, plebiscitos e recall, bem como o país obteve um dos maiores indicies de crescimento econômico do mundo, as pessoas tenderam a votar e confiar mais nas instituições.



[1]Infelizmente, o latinobarómetro não realizou pesquisas antes de 2007 para essa questão.

 


[1]Vejamos o discurso do presidente do senado federal brasileiro, Renan Calheiros, sobre o sistema político: “assumimos a responsabilidade de fazer mudanças radicais em um sistema que está falido, fedido, e provoca a eterna desconfiança da sociedade brasileira”. Fonte: O Globo, publicado em 30/11/2016.

[2]A nosso ver, a astúcia dos partidos de oposição e dos setores de comunicação de massa contrários à presidente foi canalizar a antipatia da população com relação a todos os políticos para ficar em contrário somente à presidente da república e seu partido.


[1]O medo da explosão do voto descrença/negação da representação-plutocrática fez com que, nas semanas que antecederam as eleições todos os jornalistas dos oligopólios de comunicação de massa (do jornalismo ao entretenimento, passando pelos programas de esporte e de culinária) fizessem larga campanha pelo voto, que eles chamavam de válido, e abertamente pediam para as pessoas não votarem nulo. Mesmo com toda a campanha, a expressão dos votos em não candidatos foi a maior da história.

 

[2]Esses coletivos seguiram uma tendência mundial iniciada em Chiapas no México em 1994, que teve como um dos principais lemas: “nossos sonhos não cabem em vossas urnas”.

[3]No dia 20 de junho, aproximadamente, 1,5 milhão de pessoas estavam nas ruas protestando contra os governos, portando uma extensa pauta heterogênea que incluía desde o fim do capitalismo, defendida pelos coletivos mais radicais, até demandas mais institucionais como investimentos em saúde, educação e moradia. Em comum, a negação de todos os partidos e políticos foi uma marca indelével do movimento.

[4]Não existem dados disponíveis sobre os números oficias das eleições para prefeitura anteriores a 2004.



[1]Este fato poderia abrir uma crise de legitimidade do mandatário do executivo fluminense, mas como a grande mídia sequer divulgou aquilo que chamamos de descrença/negação da representação-plutocrática, bem como do ponto de vista teórico, o modelo liberal-representativo com menor participação dos governados é justificado pela corrente da democracia shumpeteriana e seus seguidores, sequer se tocou nesse problema.

 


[1][1]Período entre 1964 e 1985 no Brasil. Para explicação da utilização desse conceito, ver De Moraes (2018).

[2]A operação lava-jato levada a cabo pela polícia federal tem confirmado o sentimento popular de grande corrupção no mundo da política.

[3]Sergio Cabral, governador do Rio de Janeiro por dois mandatos consecutivos, está preso atualmente acusado de corrupção por vários crimes.


[1]Outro aspecto a se destacar foi que o candidato do PSDB obteve menos votos que as candidatas do PT e PSB respectivamente e muito menos que a soma de brancos/nulos/abstenções.

 


[1]Corroborando para essas evidências, percebemos uma disparidade entre as eleições de 1989 e 2014, quando no comício de encerramento daquela campanha eleitoral no Rio de Janeiro aproximadamente 300 mil pessoas aglomeravam-se na Cinelândia, Rio de Janeiro, para apoiar a candidatura do PT à presidência da República; enquanto em situação similar, nas eleições de 2014, o número de pessoas não chegou a 3 mil.



[1]Em treze anos sob o governo Chávez na Venezuela, a população foi mais às urnas que em quarenta anos sob o Pacto dePunto Fijo(1958-98). Foram 3 eleições presidenciais (1998, 2000 e 2006), quatro referendos constitucionais (2004, 2009 e dois em 1999); um referendo revogatório de seu mandato (2007) e outro referendo constitucional (2007). Foi a população que decidiu se queria uma nova Constituição, então, ela votou nos constituintes, depois ainda votou pela aprovação da Constituição. A Constituição de 1999 prevê, ainda, o referendo revogatório do mandato do presidente da república, um instrumento inédito no continente americano, ao qual poucos governantes teriam coragem de se submeter. Nesse sentido, a participação popular é evidente para o temor dos defensores da democracia minimalista.

 

[1]Lema dos rebeldes em Chiapas (México).

[2]Prof. do Departamento de Ciência Política da UFRJ e dos Programas de Pós-Graducação em Filosofia (PPGF) e História Comparada (PPGHC), ambos da UFRJ. Coordenador do Grupo de Pesquisa: Observatório do Trabalho na América Latina (OTAL/UFRJ).

[3]Tribunal Superior Eleitoral.

[4]Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro.

[5]Como alguns resultados não foram disponibilizados pelos institutos oficiais brasileiros, também recorremos à compilação de dados eleitorais do Brasil realizada por Nicolau (1998).

[6]Sobre esses aspectos, Olson (1971), Downs (1958) e Dahl (1971) já descreveram muito bem, embora suas conclusões sejam absolutamente opostas às nossas.

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